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22 novembro, 2023 "Discriminação dói de maneira brutal". Associações discutiram dificuldades dXs trabalhadorxs do sexo

Seminário do Plano AproXima abordou os principais problemas de quem faz Trabalho Sexual.

Associações que prestam apoio a trabalhadorxs do sexo discutiram as dificuldades destes profissionais, e do seu trabalho de auxílio, no primeiro seminário organizado pelo Plano AproXima, o Departamento de Responsabilidade Social do Classificados X.

Coimbra acolheu, neste mês de novembro, o primeiro seminário PAR: Visões Associativas em torno do Trabalho Sexual e dos principais problemas dxs profissionais do sexo e das associações que lhes prestam serviços de apoio. Um evento organizado pelo Plano AproXima, com o apoio do Classificados X e em parceria com o Porto G, projeto da APDES – Agência Piaget para o Desenvolvimento.

Numa mesa-redonda sobre "Experiências de Intervenção no Trabalho Sexual", onde participaram Carla Fernandes da Obra Social das Irmãs Oblatas do Santíssimo Redentor, Cláudia Rodrigues da Associação para o Planeamento da Família (APF) do Alentejo, Fábio Simões do MAPS – Movimento de Apoio à Problemática da SIDA, Júlio Esteves do GAT - Grupo de Ativistas em Tratamentos, e Paulo Anjos da Associação Existências, ficaram explícitos os diversos desafios que esta realidade coloca.

"Discriminação dói de maneira brutal"

A discriminação continua a ser um dos principais problemas que afeta a vida dxs trabalhadorxs do sexo, deixando marcas profundas com consequências na saúde mental. "Dói de uma maneira brutal", referiu Cláudia Rodrigues da APF Alentejo.

As pessoas "sentem-se mesmo violentadas", constatou Cláudia Rodrigues sobre a discriminação de quem faz Trabalho Sexual.

Mas os problemas estendem-se também à saúde e à habitação numa altura de crise económica que complica tudo.

Júlio Esteves reparou no seminário do Plano AproXima que existe uma "ideia errada" de "ostentação" associada a esta atividade, como se todas xs profissionais fossem acompanhantes de luxo.

O que se passa, efetivamente, é que, "muitas vezes, não querem expor as suas dificuldades publicamente", embora enfrentem uma "realidade muito dura e muito impactante", analisou o representante do GAT no seminário. O facto de a maioria das pessoas do setor não ter "direitos sociais" básicos, torna tudo ainda mais complicado, vincou Júlio Esteves.

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“Não existem soluções” de habitação

A questão da habitação é uma dificuldade especialmente complexa, sendo, de resto, um problema para muitas pessoas de outras áreas profissionais. "Não existem soluções", lamentou Carla Fernandes no seminário, destacando que há falta de casas "quer para trabalhar, quer para viver".

Outro problema que dificulta o trabalho das associações no terreno é a grande mobilidade geográfica que está associada ao Trabalho Sexual. Júlio Esteves citou dados que indicam que 70% dos trabalhadores sexuais "dão a volta ao país" e que cerca de 40% viajam para outros países para trabalhar.

Esta mobilidade constante, com "pessoas que viajam muito" para "fazer temporadas", é um quebra-cabeças para as associações que querem apoiar a comunidade. "Hoje é uma Amanda, daqui a uns meses já é uma Joana", realçou Fábio Simões durante o seminário do Plano AproXima.

As pessoas nunca dão os seus "nomes verdadeiros", constatou o advogado que é voluntário no MAPS, referindo que esta "mobilidade muito grande" torna o trabalho das associações mais "complexo".

Assim, Fábio Simões sugeriu que é preciso olhar para a situação de uma forma "nacional", para conseguir "fazer o melhor pelas pessoas".

Referindo-se à região onde o MAPS atua em concreto, Fábio Simões sublinhou também que é preciso reconhecer que o "Algarve é uma zona de turismo sexual". Mas, enquanto "ninguém quer saber" disso, há uma situação de "cuidados de saúde nulos" neste âmbito.

O advogado realçou que há um aumento no número de pessoas que procuram o MAPS nos meses de junho, julho e agosto, altura em que o Algarve é mais procurado por turistas para passar férias. Na passagem de ano, "volta a haver um aumento" e no resto do ano é "muito inferior", reforçou.

Palestra com multidão a assistir durante o seminário do Plano AproXima.

"Mais de 80% das pessoas são estrangeiras"

Há ainda outra circunstância que marca o Trabalho Sexual em Portugal e que se prende com o facto de muitos profissionais do sexo estarem em situação irregular no nosso país, o que implica vários problemas, nomeadamente no acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Paulo Anjos destacou esta questão da "internacionalização do Trabalho Sexual" no seminário do Plano AproXima, realçando que "mais de 80% das pessoas são estrangeiras" e reparando que isso "coloca problemas urgentes".

"Nós encaminhamos pessoas para os Centros de Saúde e não são atendidas", apontou o representante da Existências, alertando que são necessárias respostas neste âmbito, até porque é a Saúde Pública que está em causa.

Fábio Simões acrescentou também que 98% das pessoas que o MAPS auxilia são "não nacionais" e destes, "80% não têm a situação regular e não vão ao Centro de Saúde".

Além de todos os problemas de saúde, sociais e económicos que enfrentam, xs trabalhadorxs do sexo ainda vivem numa enorme "solidão", especialmente no caso de pessoas estrangeiras, como reparou Paulo Anjos. "Passam muito tempo sozinhas", uma vez que não têm cá uma rede familiar próxima, concluiu.

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"Violência é cada vez mais presente"

"Os consumos, a saúde mental e a violência" são outras dificuldades da intervenção no apoio a quem faz Trabalho Sexual, como realçou Carla Fernandes das Irmãs Oblatas durante o seminário do Plano AproXima.

E quando se fala em violência, "não há uma semana em que não haja incidências", apontou Carla Fernandes. "A violência é cada vez mais presente nas mulheres" que as Irmãs Oblatas acompanham, vincou, salientando que algumas delas vivem "situações muito complicadas" a nível social e económico.

Neste âmbito, Cláudia Rodrigues citou as violências associadas ao tráfico humano e à exploração sexual, sublinhando que é "muito difícil" intervir. "Não se pode perguntar diretamente se a pessoa está a ser explorada sexualmente", sublinhou a responsável da APF Alentejo. "A decisão de contar é da pessoa", frisou, reforçando que o trabalho nesta área exige "muita sensibilidade" e "treino".

Por outro lado, Fábio Simões destacou que as pessoas precisam de "segurança" para denunciarem as situações. Mas, na realidade, "têm medo", "vivem num clima de terror", apontou o advogado do MAPS.

Já Paulo Anjos considerou que se trata de "uma bola de neve" porque as pessoas têm "medo de morrer", mas também "não querem voltar" aos seus países de origem, até porque podem ter "dívidas" e "famílias ameaçadas".

Tudo isto reforça a importância da regulamentação do Trabalho Sexual "para proteger" quem o exerce, como concluiu o responsável da Existências.

Gina Maria

Gina Maria

Jornalista de formação e escritora por paixão, escreve sobre sexualidade, Trabalho Sexual e questões ligadas à realidade de profissionais do sexo.

"Uma pessoa só tem o direito de olhar outra de cima para baixo para a ajudar a levantar-se." [versão de citação de Gabriel García Márquez]

+ ginamariaxxx@gmail.com (vendas e propostas sexuais dispensam-se, por favor! Opiniões, críticas construtivas e sugestões são sempre bem-vindas) 

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