18 Julio, 2025 Mentes Conectadas: Pessoa não binária que se sente invisível
Onde cabe o prazer destas pessoas no mundo?
Fui contactada por uma pessoa não binária que não se identifica com os discursos sobre sexualidade e prazer que, habitualmente, só consideram dois géneros: o feminino e o masculino. Onde é que se encaixa esta pessoa, afinal?

“Sou uma pessoa não binária. Nem sempre me identifico com os discursos femininos, nem me vejo nos masculinos.
Mas quando o tema é prazer, sexo ou corpo, parece que só há lugar para dois géneros. Vejo espaços que falam sobre mulheres e prazer, homens e performance, mas nada que me inclua.
Sinto-me fora, sem linguagem, sem corpo, sem voz. E, às vezes, até sinto culpa por desejar, como se o meu corpo fosse um erro.
Isto é normal? Onde é que cabe o meu prazer no mundo?”
O que sentes é legítimo. E não, não é exagero. É a realidade de muitas pessoas que, como tu, existem fora das gavetas apertadas de “homem” e “mulher”.
Vivemos numa cultura binária, onde tudo - do WC ao amor, da linguagem ao desejo - é pensado em dois extremos.
Mas o mundo real é mais complexo. E tu és parte dessa complexidade rica, viva, verdadeira.
O problema não está em ti. Está nas estruturas que ainda não aprenderam a ver para lá do óbvio.
Quando o corpo não cabe na norma
Ser pessoa não binária e viver o prazer pode ser um desafio. Porque o prazer, tal como a identidade, começa no corpo - e o teu corpo aprendeu, desde cedo, que não se encaixa no que os outros esperam.
Pode haver:
- Disforia (desconforto com partes do corpo);
- Dificuldade em ser tocadx sem dissociar;
- Falta de representação (onde estão os corpos como o teu nas conversas sobre sexo?);
- Ausência de linguagem (como nomear as tuas zonas de prazer sem te traíres?).
Tudo isso impacta a tua capacidade de sentires, de te permitires, de explorares o desejo com leveza. Mas deixa-me dizer-te: não há nada de errado contigo.
O prazer é teu - não é do sistema
O teu prazer não precisa de caber num modelo antigo para ser válido. Podes vivê-lo sem nome fixo para o teu género, sem nome “convencional” para o teu corpo; sem papel definido nas dinâmicas sexuais e sem querer corresponder à fantasia dos outros.
Podes inventar formas novas. Podes explorar com pessoas que respeitem o teu ritmo, os teus limites, os teus silêncios. E podes dizer:
“Este é o meu corpo, este é o meu tempo, esta é a minha verdade.”
Quem não respeitar isso, não te merece.
O problema do “apagamento”
O que descreves como “sentir-te invisível” tem um nome: “apagamento” não binário. É o silenciamento sistemático de quem não encaixa na narrativa dominante.
Alguns exemplos:
- Sites de educação sexual falam só de vaginas ou pénis, homens ou mulheres;
- A pornografia raramente inclui pessoas não binárias de forma digna (quando inclui);
- Consultas médicas ainda usam linguagem violenta e binária;
- Mesmo dentro da comunidade LGBTQIA+, há falta de escuta real sobre vivências não binárias.
O resultado? Vives como se fosses “exceção” quando, na verdade, és uma possibilidade que o mundo ainda não aprendeu a integrar.
Como começar a habitar o teu prazer
1. Reconhece o teu corpo como legítimo
Mesmo que não te identifiques com todas as partes, ele é teu. E merece cuidado, escuta, presença. Não tens de amar tudo, mas podes cuidar de ti sem ódio.
2. Reinventa a linguagem
Não há termos obrigatórios. Se "vagina", "pénis", "mamas", te causam desconforto, escolhe outras palavras. Ou cria as tuas. Pede que as pessoas parceiras as respeitem.
O prazer começa também na palavra.
3. Explora o toque em segurança
Sozinhx ou com outrxs, ao teu ritmo. Descobre o que te acalma, o que excita, o que assusta, o que atrai. O prazer não precisa de ser explosivo - pode ser silencioso, respirado, descoberto aos poucos.
4. Procura representatividade
Segue pessoas não binárias que falam sobre sexualidade com verdade. Há criadorxs de conteúdos, terapeutas e artistas que estão a abrir esse caminho.
Ver-te nxs outrxs ajuda a validar a tua própria vivência.
E nas relações?
Estar com outra pessoa pode ser bonito, mas também assustador, se ela não compreender o que significa a tua identidade.
Podes (e deves) dizer:
- Como gostas de ser tratadx;
- Que palavras te confortam;
- Que zonas do corpo preferes tocar ou não tocar;
- Que tipo de conexão procuras (mais emocional, mais sensorial, mais tântrica, mais verbal, etc.).
O prazer partilhado não é sobre “funções” - é sobre conexão verdadeira. E qualquer pessoa com maturidade emocional pode aprender contigo.
E se me continuar a sentir só?
A solidão é real. Mas não é tua culpa.
Procura espaços onde possas existir por inteiro. Grupos queer, comunidades online, círculos de escuta.
Faz terapia se puderes, com alguém que respeite a tua identidade.
E lembra-te: mesmo que o mundo ainda esteja a aprender a ver-te, tu podes começar por te ver com amor.
Uma palavra final
Tu existes. O teu corpo é legítimo. O teu desejo é válido. O teu prazer é possível.
Não és um erro de sistema. És um corpo que insiste em existir com verdade, mesmo quando o mundo ainda não tem linguagem para ti.
E isso - essa coragem de continuar a sentir, mesmo na ausência de espelhos - é das formas mais bonitas de resistência.
Não deixes que a invisibilidade te roube o direito ao prazer. Tu mereces viver com desejo, com corpo, com nome ou sem nome, e com dignidade.
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